CARTÓRIO LUCAS FERNANDES
8º TABELIONATO DE NOTAS DE GOIÂNIA
  • Publicado por: Tiago

PROVIMENTO 37 ATUALIZADO PELO PROVIMENTO 141 DO CNJ: O REGISTRO DA UNIÃO ESTÁVEL NO LIVRO “E” DO REG

 

1.INTRODUÇÃO

           O registro da União Estável perante o Oficial de Registro Civil das Pessoas Naturais foi regulamentado, em 2014, pelo Provimento 37 do CNJ.

           Em 16/03/2023 o Provimento 37 passou por uma verdadeira revolução com a publicação do Provimento 141 onde foram alterados e inseridos diversos pontos.

           A par de todos as polêmicas e críticas que tiveram como objeto o Provimento 141/2023, abaixo serão apontadas considerações teóricas e práticas e, claro, algumas problemáticas que, certamente, serão enfrentadas na rotina dos serviços de Registro Civil das Pessoas Naturais – RCPN.

2. TÍTULOS REGISTRÁVEIS

           É bem sabido que, para que seja efetivado algum registro, mister se faz a existência prévia de um título. Apesar da facultatividade registral, a União Estável tem ingresso registral no Livro “E” do RCPN e, para tanto, precisa estar formalizada em algum dos títulos abaixo listados:

a.SENTENÇA NACIONAL DE RECONHECIMENTO E/OU DISSOLUÇÃO;

b.SENTENÇA ESTRANGEIRA DE RECONHECIMENTO E/OU DISSOLUÇÃO – DEVE ESTAR “NACIONALIZADA”;

c.ESCRITURA PÚBLICA NACIONAL DE RECONHECIMENTO E/OU DISSOLUÇÃO;

d.ESCRITURA PÚBLICA ESTRANGEIRA DE RECONHECIMENTO E/OU DISSOLUÇÃO – DEVE ESTAR “NACIONALIZADA”;

e.TERMO EXTRAJUDICIAL ESTRANGEIRO – DEVE ESTAR “NACIONALIZADO”;

f.INSTRUMENTO PARTICULAR ESTRANGEIRO DE CONSTITUIÇÃO E/OU DISSOLUÇÃO BEM COM RESPECTIVOS DISTRATOS – DEVEM ESTAR “NACIONALIZADOS”;

g.TERMO DECLARATÓRIO LAVRADO POR OFICIAL DO RCPN (RECONHECIMENTO E DISSOLUÇÃO);

 

3.COMPETÊNCIA PARA LAVRAR TERMO DECLARATÓRIO E PARA O RESPECTIVO REGISTRO

 

           Para lavrar Termo Declaratório de União Estável – TDU os conviventes podem optar por qualquer RCPN do país (art.1º-A do Prov. 37/2013 do CNJ).

           Já para a efetivação do registro, será competente o RCPN do local da última residência dos conviventes.

           Em se tratando de registro de título estrangeiro, será competente o RCPN do local da última residência de algum dos conviventes no território nacional (artigo 94-A, S 2 lei 6.015) e, caso nenhum dos conviventes tenham residido no Brasil, será competente o 1º Ofício do Distrito Federal.

 

4. ELEMENTOS OBRIGATÓRIOS DO REGISTRO DA UNIÃO ESTÁVEL NO LIVRO “E”

 

           Para que o Oficial posso proceder com o Registro, após a qualificação do título, mister que estejam presentes os seguintes elementos:

a) Data do registro;

b) Nome, estado civil, data de nascimento, profissão, CPF e residência dos companheiros;

c) Nome dos país dos companheiros;

d) Data e cartório em que foram registrados os nascimentos das partes, seus casamentos e uniões estáveis anteriores, bem como os óbitos de seus outros cônjuges ou companheiros, quando houver;

e) Data da sentença, trânsito em julgado da sentença e vara e nome do juiz que a proferiu, quando for o caso;

f) Data da escritura pública, mencionados o livro, a página e o tabelionato onde foi lavrado o ato;

g) Data do Termo Declaratório e a serventia em que foi formalizado, quando for o caso.

h) Regime de bens dos companheiros;

i) Nome que os companheiros passam a ter em virtude da união estável.

           Caso o título apresentado for de natureza estrangeira, o registro deve conter, também:

a) A indicação do país em que foi lavrado o título estrangeiro envolvendo união estável com, ao menos, um brasileiro;

b) A indicação do país em que os companheiros tinham domicílio ao tempo do início da união estável e, no caso de serem diferentes, a indicação do primeiro domicílio convivencial.

           A data de início e fim da união estável é prevista como requisito do registro, conforme art. 2º, IV, do Provimento 37/2013 do CNJ. Porém, é preciso que este requisito seja observado de uma forma especial e muito apurada, para que não se coloque em risco a segurança jurídica do ato. No capítulo próximo o tema será tratado com a devida atenção.

 

5. DATA DE INÍCIO E FIM DA UNIÃO ESTÁVEL EM SEU RESPECTIVO REGISTRO 

 

           Certo é que a inserção da data de início da União Estável, principalmente, nos títulos que são aptos a registro é algo bastante tormentoso no ambiente Registral.

           Particularmente, não vejo maiores problemas neste assunto, uma vez que, salvo a sentença judicial, nenhum dos títulos em que a União Estável é formalizada gera presunção absoluta de verdade do que ali fora narrado.

           Claro que, em se tratando de título com aporte de fé-pública (escritura pública, termo declaratório, etc.), a presunção de verdade passa a existir, porém, sempre se admitindo prova em contrário e, consequentemente, desconsideração dos termos ali contidos.

           O grande problema que vejo, atualmente, é que alguns títulos, ainda que detenham fé-pública, não terão a data de início da União Estável, nele contida, considerada para fins de Registro da União Estável.

           Pecou gravemente o Provimento 141/2023 ao desqualificar a fé-pública da data de início da União Estável contida na escritura pública, sendo que admite-se que o registro considere a data de início por mera declaração perante o Oficial do RCPN (art. 2º, III do Provimento 37/2013 do CNJ).

           Ora, se a intenção de restringir a inserção da data de início é  resguardar a segurança jurídica quanto à produção retroativa de efeitos da União Estável, não faz absolutamente nenhum sentido que a data de início da União Estável contida em Escritura Pública não detenha fé-pública para tanto, e que uma mera declaração ao Oficial do RCPN seja suficiente. Resta claro aqui que a autoridade normativa criou uma espécie de “hierarquia da fé-pública” o que efetivamente não existe em nosso ordenamento jurídico.

           Ou se considera a data de início em todos os títulos que estejam aportados com fé-pública ou não se considera em nenhum. É uma verdade aberração jurídica essa distinção entre atos igualmente praticados e acobertados pela fé-pública.

           Portanto, considerando que a vontade do legislador é garantir aos conviventes o direito de ter a data de início apontada no registro, acredito na viabilidade da inserção da data de início da União Estável em qualquer dos títulos registráveis, desde que aportados com fé-pública, especialmente as escrituras públicas, sentenças e termos declaratórios.

 

6. ALTERAÇÃO DAS REGRAS DE CONVIVÊNCIA DA UNIÃO ESTÁVEL (REGIME DE BENS POR EQUIPARAÇÃO)

 

           A boa técnica na produção de normas é extremamente importante e sempre deve ser observada, pois sua ausência acaba por gerar grandes imbróglios sem qualquer necessidade.

           No caso em específico, a autoridade normativa denominou o Capítulo II do Provimento 37/2013 do CNJ de “ALTERAÇÃO DE REGIME DE BENS NA UNIÃO ESTÁVEL”. Um equívoco que acaba causando problemas de forma desnecessária.

           Discordo de forma veemente da utilização do termo “Regime de Bens” em se tratando de União Estável, pois o que temos, em verdade, não é a adoção de um regime de bens na formalização da União Estável, mas sim a possibilidade de que os conviventes possam estabelecer, CONTRATUALMENTE, regras de convivência, e que tais regras podem ser análogas às regras dos regimes de bens que regulamentam o casamento.

           Assim dispõe o artigo 1.725 do Código Civil, que traz, como regra, a celebração de um contrato escrito para estabelecer as regras de convivência e que, APENAS SE NÃO HOUVER ESTE CONTRATO, aplicar-se-ão, POR ANALOGIA, ou seja, NO QUE COUBER, as regras do regime de comunhão parcial de bens.

           Importa ressaltar que o contrato mencionado no art. 1.725 do Código Civil, NÃO É PACTO ANTENUPCIAL, pelo óbvio motivo de que, se é União Estável, as partes não contraem núpcias, logo, materialmente impossível um pacto antenupcial para situação que não envolve contração de núpcias.

           Logo, a regulamentação que temos a partir do artigo 9º-A do Provimento 37/2013 do, em verdade, NÃO É PARA ALTERAR REGIME DE BENS, mas sim para ALTERAR O CONTRATO QUE REGE A CONVIVÊNCIA das partes que convivem em União Estável.

           Pelo teor do que consta do art. 9º-A, § 4º, in fine, resta consolidado que o procedimento ali previsto não se trata efetivamente de uma alteração de regime de bens, ao observarmos uma “gambiarra” a respeito da escolha das regras do regime de comunhão universal de bens, quando diz que os efeitos serão apenas ex nunc com a garantia de direito de terceiros. É absolutamente impossível que um ato normativo possa criar tal regra em detrimento da regra estabelecida no Código Civil. Portanto, ou temos, efetivamente, uma mera alteração contratual, ou temos um ato normativo eivado de inconstitucionalidade. Prefiro a primeira conclusão.

           Partindo desta conclusão, muito mais fácil e mais lógico é seguir adiante, pois, alteração contratual, em nosso ordenamento jurídico, é permitida em qualquer tempo e com a ampla garantia ao princípio da autonomia da vontade e que, neste caso, pode ser requerida em qualquer RCPN com posterior encaminhamento, via CRC, ao ofício competente (do local do registro da União Estável).

           Pois bem, em consenso de considerar se tratar de uma alteração contratual, ainda que tal contrato estabeleça, POR ANALOGIA, as regras de um determinado regime de bens, não vejo problema algum que seja feito perante o Oficial de Registro Civil das Pessoas Naturais, desde que se observe as mínimas garantias à ordem pública e aos bons costumes.

           Em se tratando de uma mera alteração no contrato de convivência que, repita-se, eventualmente pode adotar – POR ANALOGIA – as regras de um determinado regime de bens, não vejo qualquer problema de que tal alteração seja levada à margem do registro da União Estável.

           Para tanto, por se tratar de uma alteração contratual de instrumento chancelado com registro público, por óbvio que a formalização da sua alteração deve seguir o mesmo caminho, com requerimento de AVERBAÇÃO DAS ALTERAÇÕES à margem do assento da União Estável.

           Importa ressaltar que, se a alteração contratual envolver resolução patrimonial em razão das regras a serem alteradas, exige-se a presença do advogado.

           Neste aspecto, para manter a coerência do meu posicionamento, entendo que a presença do advogado, apenas para alteração das regras de convivência – ainda que haja resolução patrimonial – não poderia ser exigida, uma vez que a lei obriga a presença do advogado apenas em caso de DISSOLUÇÃO da União Estável. Para aplicar a regra do 733 do CPC por analogia deveríamos estar diante de uma dissolução de união estável e não uma mera alteração nas regras de convivência.

 

7. CONCLUSÃO 

 

           Neste pequeno expositivo sobre minhas conclusões a respeito do Provimento 141/2023 do CNJ, preferi não abordar os aspectos tributários (que ao meu ver também são graves), bem como preferi não adentrar no capítulo que trata da conversão da União Estável em casamento.

           A intenção principal neste artigo é demonstrar que o instituto da União Estável, por mais que se queira, jamais poderá ser equiparado ao casamento. No campo das comparações, certo é que temos praticamente 99,9% de identidade entre as características, porém, como sempre diz o Ilustre Prof. José Roberto Mello Porto: “Pelicano não é Baleia”.

           Por fim, concluo com uma frase que sempre repito em minhas aulas e que acabou virando um jargão entre os alunos: União Estável e Casamento: posso comparar, mas jamais equiparar.

 

Fonte: Academia Notare